Você pretende fazer uma doação para o seu filho?
Cuidado: você pode prejudicá-lo!
A doação de pai para filho (a) – doação de ascendente para descendente – é um instrumento muito utilizado para a efetivação do planejamento sucessório, que nada mais é do que planejar o destino dos bens de uma determinada pessoa após a sua morte.
Em linhas gerais, a finalidade da doação é a transferência do patrimônio do doador para o donatário sem nenhuma contraprestação.
No Brasil, em regra, a doação em vida feita de ascendente para descendente importa adiantamento de legítima e o bem doado estará sujeito à colação (artigo 544 do Código Civil).
Isso significa que, nesses casos, a doação recebida pelo filho quando o pai ainda estava vivo deverá ser informada no inventário, a fim de que seja deduzida da sua parte da herança.
Logo, se na escritura pública de doação NÃO houver cláusula expressa de dispensa de colação, o filho deverá trazer o bem doado ao acervo hereditário para igualar a legítima.
Exemplificando: suponha que o pai tenha deixado dois herdeiros e, em vida, um deles recebeu uma doação em adiantamento de legítima no valor de R$100.000,00 (cem mil reais).
Quando o pai faleceu, o patrimônio dele era de R$400.000,00. Pelo fato da escritura pública de doação nada mencionar sobre a dispensa de colação, o filho deverá trazer os R$100.000,00 recebidos por doação ao inventário (obrigação de colacionar o bem).
Assim, o patrimônio do falecido, na verdade, será de R$500.000,00 (R$400.000,00 + R$100.000,00). E cada herdeiro deverá receber R$250.000,00 (R$500.000,00 divididos por 2 herdeiros).
Na partilha, aquele filho que já recebeu R$100.00,00 antecipadamente irá receber apenas R$150.000,00 de herança (R$250.000,00 – R$100.000,00). Ao passo que o filho que não recebeu qualquer doação de seu pai receberá R$250.000,00.
Desse modo, se o objetivo do pai é beneficiar um filho por meio da doação em vida, no ato da liberalidade, deve haver menção expressa de que o bem foi doado com dispensa de colação (artigo 2.005 do Código Civil).
No caso de dispensa de colação, o filho que recebeu o valor de R$100.000,00 não será obrigado a informar a doação nos autos do inventário de seu pai, ou seja, não sofrerá dedução em sua parcela da herança.
De acordo com o exemplo mencionado, considerando que a doação em vida foi efetuada com cláusula de dispensa de colação, os dois herdeiros receberão R$200.000,00 no momento da partilha (R$400.000,00 divididos por 2 filhos).
Portanto, verifica-se que o filho que recebeu a doação em vida foi beneficiado, eis que recebeu R$100.000,00 pela doação e R$200.000,00 pela herança, totalizando R$300.000,00. E o outro filho recebeu apenas R$200.000,00.
Ressalta-se, contudo, que a doação de pai para filho com cláusula de dispensa de colação pressupõe que o patrimônio doado saia da parcela disponível da massa patrimonial do ascendente (pai).
E isso porque, quando o doador possui herdeiros necessários (que são os descendentes, ascendentes e cônjuge/companheiro), a parcela de 50% do patrimônio compõe a legítima, que é a parte indisponível do acervo patrimonial, ou seja, a parte que, comumente, chamamos de “intocável” e que deve ser garantida aos herdeiros necessários.
Diante disso, resta evidente que um planejamento sucessório eficiente e estratégico é capaz de preservar a vontade do autor da herança e, ainda, evitar posteriores conflitos familiares.
Conclui-se, portanto, que o ato de doar um bem ao filho não é tão simples como muitos imaginam. Se a escritura pública de doação de ascendente para descendente não for lavrada com as disposições necessárias e pertinentes, o doador – pai – poderá prejudicar o filho que pretendia beneficiar.
Fonte: jusbrasil.com
Mª Gabriela de Morais Machado, sócia proprietária de Morais Machado Advogados.